Merece elogios a atitude do Itamaraty ao convocar o encarregado de negócios da embaixada dos Estados Unidos no Brasil, Gabriel Escobar, para expressar ao funcionário a “profunda indignação” do Brasil com postagens recentes do Departamento de Estado e da embaixada estadunidense nas redes sociais.
O protesto foi transmitido pelo embaixador Flavio Goldman, que chefia interinamente a Secretaria de Europa e América do Norte no Ministério das Relações Exteriores.
Goldman manifestou indignação com o tom e o conteúdo das postagens.
Na avaliação da cúpula do Itamaraty, as publicações representam “clara ingerência” em assuntos internos e “ameaças inaceitáveis” a autoridades brasileiras.
Na quarta-feira (6), dois dias após a prisão domiciliar do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), o Departamento de Estado e a embaixada dos Estados Unidos em Brasília publicaram mensagem nas redes sociais em que acusam o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes de “flagrantes violações de direitos humanos”:
“O ministro Moraes é o principal arquiteto da censura e perseguição contra Bolsonaro e seus apoiadores. Suas flagrantes violações de direitos humanos resultaram em sanções pela Lei Magnitsky, determinadas pelo presidente Trump”, dizia a postagem.
O protesto brasileiro, no entanto, não foi suficiente para que os Estados Unidos moderassem seu tom.
Logo no sábado (9), os Estados Unidos reincidiram em manifestação inaceitável de ingerência em assunto interno ao Brasil.
Em post na rede X (ex-Twitter), o subsecretário de Estado Christopher Landau afirmou que o ministro Alexandre de Moraes é responsável por “destruir” a relação entre o país e o Brasil.
E seguiu Landau com acusações mentirosas de que Moraes usurpava poderes para atacar chefe de outro poder, sem se referir a Bolsonaro. Numa incrível inversão da verdade, acusou Moraes de querer impor uma extraterritorialidade ao decidir que a lei brasileira tivesse a condição de impedir a publicação de conteúdos em plataformas nos Estados Unidos, quando é a Casa Branca que sanciona Moraes e quer assumidamente ordenar à Justiça brasileira que não prossiga com o julgamento dos envolvidos na tentativa de golpe para impedir a posse de Lula em 2023, além dos que tramaram o assassinato do presidente eleito, de seu vice, Geraldo Alckmin, e do próprio Moraes.
As arremetidas estadunidenses são graves. Agridem a independência do Brasil. Fustigam o funcionamento e a autonomia dos poderes republicanos. Porque ofendem o Brasil, fizeram renascer uma consciência da importância da soberania brasileira. Se tencionavam fazer esmorecer o ânimo de defesa da pátria, só conseguiram despertá-lo como nunca. Se queriam corroer o apoio ao julgamento de Bolsonaro e outros líderes da intentona, não conseguiram. Visto mundialmente como um exemplo de firmeza no repúdio ao intervencionismo de Donald Trump, o presidente Lula viu crescer sua imagem, dentro e fora do país, como referência de estadista na defesa da soberania ameaçada.
Se queriam semear o pânico, também aí fracassaram. Lula tem conseguido responder sem aceitar humilhação, mas sem estridência, enquanto busca manter canais de negociações comerciais. Na tarde do sábado, Landau voltou a postar, num tom que parecia acenar com a intenção de normalização das históricas relações diplomáticas entre Brasil e EUA.
Manteve, porém, o fogo contra o ministro Moraes. Este, o Supremo Tribunal Federal e o Brasil saberão responder na melhor medida, na linguagem e no prazo adequados, na forma das justas sentenças aos acusados do golpe e aos que seguem desacatando a Corte e tentando chantagear todo um país.
Foto reproduzida da Internet