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O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) envia nesta segunda-feira (18) um relatório ao Escritório do Representante de Comércio dos Estados Unidos (USTR) em resposta à investigação aberta pela gestão de Donald Trump, atual presidente dos EUA, com base na Seção 301 da Lei Comercial norte-americana. O procedimento mira supostas práticas “desleais” no Brasil e coloca no centro do debate o PIX, o mercado de etanol, a proteção à propriedade intelectual, a fiscalização anticorrupção, as tarifas preferenciais e o desmatamento ilegal
Segundo o Metrópoles [1], o envio do documento ocorre em meio a um ambiente diplomático mais tenso entre os dois países, acentuado por anúncios recentes de sanções a autoridades brasileiras e ameaças de novas medidas retaliatórias por parte da Casa Branca.
O que está sob escrutínio do USTR
A abertura da investigação foi anunciada em 15 de julho e desde então o USTR passou a receber contribuições de cidadãos e entidades. O escopo envolve seis frentes:
- Comércio digital e serviços de pagamento eletrônico — os EUA afirmam que o Brasil teria criado um ambiente hostil a big techs, mencionando decisões do STF, e citam “práticas desleais” ligadas ao PIX;
- Tarifas preferenciais — alega-se que acordos brasileiros com terceiros teriam reduzido tarifas de modo a prejudicar exportações dos EUA;
- Fiscalização anticorrupção e transparência — questiona-se um suposto enfraquecimento de controles, com impacto competitivo sobre empresas americanas;
- Propriedade intelectual — o documento cita omissões na proteção de direitos autorais e patentes, afetando setores de tecnologia e indústria criativa;
- Mercado de etanol — Washington reclama de tarifas mais altas e de desequilíbrios após o Brasil abandonar o tratamento recíproco quase isento;
- Desmatamento ilegal — aponta-se que a destinação de áreas desmatadas à produção agrícola geraria vantagem competitiva indevida a produtores brasileiros.
Sanções e escalada de atritos
Na quarta-feira (13), a Casa Branca anunciou sanções a Mozart Sales e Alberto Kleiman, servidores ligados à criação do Mais Médicos. A filha e a esposa do ministro da Saúde, Alexandre Padilha (PT), também tiveram restrições de entrada nos EUA. A justificativa norte-americana é que o programa brasileiro teria beneficiado o regime de Cuba, alvo de embargo econômico desde os anos 1960.
Não é um fato isolado. Em episódios anteriores, o ministro Alexandre de Moraes, do STF, e outros sete magistrados tiveram visto suspenso. Paralelamente, a administração Trump adotou sobretaxa de 50% sobre produtos brasileiros que entram no mercado norte-americano, ampliando o desgaste comercial.
Por que a seção 301 importa
A Seção 301 autoriza Washington a investigar e, se entender cabível, impor medidas unilaterais em resposta a práticas consideradas injustas por parceiros comerciais. Em casos semelhantes, o instrumento já embasou tarifas punitivas e barreiras adicionais. Para o Brasil, o risco é ver cadeias exportadoras — do agronegócio à indústria de base tecnológica — pressionadas por custos e incertezas regulatórias.
O que o Brasil vai argumentar
O relatório brasileiro, que chega ao USTR nesta segunda, deve rebater as acusações e contextualizar pontos sensíveis:
- PIX — enfatizar o caráter público e interoperável do arranjo de pagamentos, pioneiro em inclusão financeira e competição;
- Propriedade intelectual — detalhar normas e enforcement já existentes e iniciativas de modernização;
- Etanol — apresentar a política tarifária e mecanismos de equilíbrio entre oferta interna, preços e compromissos internacionais;
- Desmatamento — listar ações de combate à ilegalidade e metas ambientais, além de instrumentos de rastreabilidade e monitoramento;
- Anticorrupção — elencar leis, órgãos de controle e medidas recentes de transparência;
- Tarifas preferenciais — defender que acordos comerciais seguem regras multilaterais e não discriminam os EUA;
Impacto para empresas e consumidores
Dependendo do desfecho, empresas brasileiras que exportam aos EUA podem enfrentar novos custos. Setores de tecnologia, criativos, sucroenergético e agrícola estão entre os mais expostos. Do lado doméstico, qualquer reação brasileira — seja via contestações jurídicas ou contramedidas — também pode afetar preços e cadeias de suprimentos, inclusive em insumos industriais e bens de consumo importados.
Foto: Ricardo Stuckert/PR