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O baú de um repórter

Nos bastidores da notícia que integram o meu baú de memórias tem uma informação interessante que conto agora. De certa forma até engraçada. A seguir:

O dia em que um produtor rural estirou o dedo para FHC

Corria o ano de 1996. O presidente da República era Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Os brasileiros condenavam o governo por não cumprir as cinco metas de campanha: emprego, saúde, segurança, agricultura e educação. O setor agrícola estava cercado por entraves. Segundo pesquisa IstoÉ/Brasmarket, publicada em 19 de junho pela revista com destaque de capa sob o título “Os dedos quebrados do presidente”,  51,9% dos entrevistados acreditavam que a promessa de campanha não tinha chegado ao campo, contra 31,4% que viam a atuação do governo como parcialmente positiva.

O deputado Alcides Modesto (PT-BA), ex-presidente da Comissão de Agricultura e Política Rural da Câmara, integrava o primeiro grupo. “A agricultura foi um dedo amputado pelo governo”, disse. Em pólo ideológico oposto, o deputado Hugo Biehl (PPB-SC), um dos líderes da bancada ruralista, concordava com o parlamentar petista. “O governo tem se mostrado absolutamente incapaz para reagir às situações no campo”, garantiu Biehl. Ele acreditava que os resultados só não eram mais desfavoráveis para o governo porque a pesquisa foi realizada em capitais e não na área rural. 

Foi aí que os produtores rurais do Nordeste decidiram realizar uma manifestação de protesto na BR-101 na divisa de Pernambuco com Alagoas. A intenção era interromper a rodovia com caminhões, tratores e máquinas agrícolas para chamar a atenção do governo. No Rio Grande do Norte a Asplan [Associação dos Plantadores de Cana] organizou uma comitiva para participar do protesto. Um ônibus foi fretado pela entidade. Era eu na época repórter de Economia do Diário de Natal. Fui, juntamente com o fotógrado Eduardo Maia escalado para cobrir o evento. Fomos no mesmo ônibus dos produtores de cana do estado à convite da Asplan. Pela Tribuna do Norte foi Carlos Magno, hoje na coordenadoria de imprensa do governo estadual. Salvo engano Emerson Amaral era o fotógrafo da Tribuna que acompanhou Carlos Magno.

Saímos de Natal por volta das 5h e chegamos ao local da manifestação umas 10h. O trânsito na BR-101 próximo ao local da manifestação a essa altura já estava interditado. Ônibus, caminhões, carros de passeio, todos eram obrigados a estacionar no acostamento orientados pela Polícia Rodoviária Federal. Tinha no local de 300 a 400 produtores rurais. Os discursos ainda não haviam começado. Quando foram iniciados os pronunciamentos eu e Carlos Magno nos postamos de uma maneira que pudéssemos acompanhar melhor. Foi aí que aconteceu o inusitado. O terceiro produtor rural a tomar a palavra, um senhor de meia idade, espalmou a mão direita e em alto e bom som pra todo mundo ouvir disse: “Vocês estão vendo aqui as cinco metas de campanha de Fernando Henrique Cardoso: emprego, saúde, segurança, agricultura e educação. Sabem qual é o dedo da agricultura. Esse dedo aqui ó”, mostrando o dedão da mão direita, aquele que a gente costuma estirar quando tem raiva de alguém num gesto obsceno. Foi aplaudido entusiasticamente.  A menifestação foi um sucesso sob o ponto de vista da repercussão. À noite foi notícia com direito a chamada no Jornal Nacional, da Globo.

Encerrado o evento a comitiva da Asplan parou para almoçar. Naquela época não existia celular nem notbook, para que a gente pudesse passar as matérias. O que fizemos, eu e Carlos Magno. Acabamos de almoçar, isso já era por volta das 15h, e ligamos de um orelhão para as redações – Diário e Tribuna – para passar as informações a tempo de serem editadas. Na redação do Diário quem pegou as minhas informações foi Margareth, Meg, a chefe de reportagem na época. Combinamos que ao ser editado o material se deixasse uma janela para a foto ou as fotos que ainda seriam reveladas quando chegássemos na redação. Janela no jargão jornalístico para quem não sabe é o espaço ou buraco deixado para colocar uma foto. No dia seguinte estava lá nas páginas do DN e da TN as matérias com as fotos. Confesso que não lembro se a foto do agricultor estirando o dedo foi tirada e se saiu em algum dos jornais. 

Obs do blog: O leitor-internauta interessado em conhecer a série de textos que já publiquei no Baú de um Repórter é só ir em BUSCA na coluna à direita do blog e digitar uma palavra-chave

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