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Com a chancela da cúpula da Polícia Civil e da Procuradoria-Geral de Justiça do Rio, uma delegada foi ao condomínio de luxo onde cumpre prisão domiciliar Júlia Lotufo, 29, viúva do miliciano Adriano da Nóbrega, para tratar de sua proposta de delação premiada sobre o chamado “escritório do crime” no Rio. Os encontros aconteceram sem que o delegado e as promotoras responsáveis pelo caso tivessem conhecimento, embora o duplo homicídio da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes estivesse na pauta de um pretenso acordo de colaboração premiada. A informação foi publicada pelo jornal Folha de S.Paulo [1].
Ativista de direitos humanos, Marielle foi morta em março de 2018 pelo crime organizado. Os atiradores efetuaram os disparos em um lugar sem câmaras na região central do Rio e, antes, haviam perseguido o carro dela por cerca de três, quatro quilômetros. Promotores investigam se houve ligação entre o crime e o chamado Escritório do Crime, grupo de matadores profissionais e que tinha Adriano como um de seus integrantes – a mãe e a esposa do miliciano trabalharam no gabinte de Flávio Bolsonaro quando o atual senador era deputado estadual.
Em maio e junho deste ano, foram ao menos dois encontros em um condomínio na orla da Barra da Tijuca, zona oeste do Rio. Titular da delegacia de Homicídios da Capital (DHC) à época, Moisés Santana afirmou que desconhecia a ocorrência dessas reuniões. “Desconheço. E, como não sou mais o delegado titular, não é mais minha atribuição”, disse ele, que foi exonerado do cargo em 6 de julho.
A delegada Ana Paula Costa Marques de Faria conduziu as conversas com Júlia Lotufo. Nome de confiança do secretário de Polícia Civil, Allan Turnowski, ela é chefe da Coordenadoria de Investigação de Agentes com Foro (Ciaf).
Segundo relatos, após as conversas com Júlia, a delegada sugeriu que as promotoras Simone Sibilio e Letícia Emile ouvissem a versão da viúva sobre o assassinato de Marielle.
A viúva de Adriano da Nóbrega prestou um depoimento com a participação da delegada Ana Paula no dia 8 de julho. Dois dias depois, as promotoras saíram da força-tarefa por suposta interferência nas investigações.
Em nota, a Secretaria de Polícia Civil disse que as “ameaças à segurança e os problemas com o funcionamento da tornozeleira da presa criaram a necessidade das idas da delegada e membros de sua equipe ao local onde Júlia cumpre prisão domiciliar”. “Todas as medidas adotadas foram comunicadas às autoridades competentes”, afirmou.
Questionado por que a delegada foi encarregada de ouvir Júlia sem conhecimento de promotores, o “Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro informa que não se pronuncia nem divulga qualquer dado relacionado a colaboração premiada, nem mesmo a existência de simples tratativa para sua realização, por expressa vedação legal”.