Está no g1
A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF [1]) decidiu de forma unânime, nesta terça-feira (20), tornar réus mais 10 acusados de integrar a trama golpista que tentava manter o então presidente Jair Bolsonaro [2] no poder, apesar da derrota nas eleições de 2022.
Os ministros acompanharam o voto do relator, Alexandre de Moraes [3]. Ele acolheu parcialmente a denúncia, pois afirmou que não há elementos suficientes para acolher a denúncia contra dois militares: o coronel da reserva Cleverson Magalhães e o general Nilton Diniz Rodrigues (veja todos os denunciados mais abaixo).
“Em relação a dois denunciados, entendo não presentes os elementos necessários para justa causa em relação a Cleverson Magalhães e Nilton Diniz Rodrigues. Os pressupostos necessários para configuração de justa causa para abertura de ação penal não estão presentes”, afirmou Moraes.
Moraes é o relator do caso, portanto, foi o primeiro a se manifestar. Ele foi acompanhado pelos ministros Flávio Dino, Luiz Fux, Cámen Lúcia e Cristiano Zanin.
A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) julgou nesta terça-feira (20) as denúncias contra 11 militares e um policial federal do chamado “núcleo 3”, de ações táticas.
➡️A lista inclui os “kids pretos” — também chamados de “forças especiais” (FE) —, militares da ativa ou da reserva do Exército, especialistas em operações especiais.
Segundo a Polícia Federal, entre as ações elaboradas pelos indiciados neste grupo havia um “detalhado planejamento operacional, denominado ‘Punhal Verde e Amarelo’, que seria executado no dia 15 de dezembro de 2022″ para assassinar os já eleitos presidente Lula e vice-presidente Geraldo Alckmin.
Estão em julgamento nesta terça as denúncias contra:
- general Estevam Gaspar de Oliveira
- tenente-coronel Hélio Ferreira Lima
- tenente-coronel Rafael Martins de Oliveira
- tenente-coronel Rodrigo Bezerra de Azevedo
- Wladimir Matos Soares, agente da Polícia Federal (PF)
- coronel Bernardo Romão Corrêa Netto
- coronel da reserva Cleverson Ney Magalhães
- coronel Fabrício Moreira de Bastos
- coronel Marcio Nunes de Resende Júnior
- general Nilson Diniz Rodriguez
- tenente-coronel Sérgio Cavaliere de Medeiros
- tenente-coronel Ronald Ferreira de Araújo Júnior
Voto de Moraes
Moraes destacou em seu voto que os militares não acreditavam em fraude nas urnas eletrônicas, mas insistiram no discurso “golpista” como um “antídoto” para tentar convencer as Forças Armadas em caso de derrota nas eleições.
Ele afirmou que, assim como aconteceu em outros países europeus e nos EUA, a tentativa de ruptura institucional se baseia em ataque a instituições democráticas e não à democracia diretamente.
“Esse populismo extremista digital, não só no Brasil, essa extrema direita que não acredita na democracia, aprendeu que atacar diretamente a democracia não dá ibope. Então, não se ataca a democracia, se ataca os instrumentos. ‘Olha, eu sou a favor da democracia, mas houve tanta fraude que nós temos que dar um golpe para restabelecer a democracia’. Isso foi feito na Hungria, esse foi feito na Polônia, esse discurso foi feito lá atrás nos Estados Unidos”, disse.
O ministro afirmou ainda que “não há dúvidas que há indícios” contra os acusados, e que o desrespeito à hierarquia é uma das características de golpes.
“Não só no Brasil, mas no resto do mundo, a história mostra que a subversão hierárquica é característica de golpes. E aqui se iniciou a subversão quando o comandante chefe das forças armadas ignora o comandante do exército e chama um oficial subalterno”.
Ele prosseguiu: “A nação não estava preocupada com o abandono dos militares, não estavam pedindo aos militares. Os militares sabem que as Forças Armadas não eram o Poder Moderador, que substituía o imperador. Esse Poder Moderador deixou de existir com a constituição de 1991”.
‘Tentativa de golpe’
Moraes também rebateu o argumento de parte dos advogados dos acusados que disseram não ter havido golpe, mas uma tentativa de golpe, o que não deveria ser punido.
“O golpe de estado e aqui já foi dito várias vezes que o crime de atentar contra democracia, contra o Estado e o direito de praticar golpe de estado, não existe tentativa. Se a execução se iniciou e o golpe de estado não se consumou, o crime é consumado. Porque se o golpe de estado se consumar, não há crime a ser analisado”.
Um dos advogados de defesa afirmou que os comandantes da Forças não aderiram ao plano e isso era fundamental para executar o golpe. Por isso, o meio para concretizar o fato seria ineficaz e por isso não se poderia punir os acusados.
“Parece que aqui nenhum dos presentes e todos aqueles que nos ouviram, ninguém acredita que se houvesse golpe de estado estaríamos aqui a julgar esses fatos. Eu dificilmente seria o relator. Talvez aí a minha suspeição fosse analisada pelos ‘kids pretos”, afirmou Moraes.
O ministro também reiterou que, em uma democracia, após o segundo turno, as Forças Armadas “não têm que decidir nada”.
“As forças armadas não tem que decidir nada, não tem que decidir para que lugar nenhum o presidente que perdeu a reeleição vai, quem perde a eleição em uma democracia — seja no Brasil, seja na Inglaterra, na França, em Portugal, nos Estados Unidos —, quem perde as eleições vai para casa e vira oposição e tenta voltar quatro anos depois, esse é o regime democrático”.
“Aqui essas declarações apoiadas após a conversa com o denunciado demonstram, é que o que a procuradoria imputou da sequência dessa tentativa de golpe tem indícios razoáveis que serão analisados durante ação penal. Também tem muito a ver com a presença de um indivíduo”, prosseguiu.
Crimes analisados
Os investigados foram denunciados por cinco crimes:
- organização criminosa armada
- tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito
- golpe de Estado
- dano qualificado pela violência e grave ameaça, contra o patrimônio da União, e com considerável prejuízo para a vítima
- deterioração de patrimônio tombado
- Desde março, o Supremo já tornou réus 21 investigados pela trama golpista — entre eles, Bolsonaro, Braga Netto e seus principais aliados.
As defesas dos acusados
Pela manhã, o STF ouviu os advogados dos 12 acusados. Em comum, as defesas:
- pediram a rejeição da denúncia por “falta de provas”;
- afirmaram que a reunião de novembro de 2022 que contou com a presença dos “kids pretos” não teve tom golpista – advogados usaram termos como “confraternização” e “conversa de bar” para descrever o encontro;
- negaram que o grupo tenha pressionado o Alto Comando do Exército para aderir ao golpe de Estado – e disseram, inclusive, que seria incomum um coronel pressionar um general (patente superior);
- questionaram a validade da delação do tenente-coronel Mauro Barbosa Cid, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro;
- colocaram em xeque a competência do Supremo Tribunal Federal (STF) para julgar as denúncias, já que os militares não têm foro privilegiado;
- ressaltaram o currículo dos militares acusados – citando, por exemplo, missões internacionais executadas por eles.
Todos os recursos apresentados pela defesa, as chamadas “preliminares”, foram rejeitadas por unanimidade na Primeira Turma.