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por Stella Galvão
‘Hei de envolver-te até meu padecer de todo fenecer’, diz o apaixonado ao final da canção ‘Rosa’, obra-prima do compositor Pixinguinha. Em 2/junho, uma segunda-feira, a rosa potiguar, envolvida na trama dos assim chamados democratas do partido Dem, murchou estrepitosamente, padeceu e feneceu em seu projeto (ou melhor, dela e do co-autor, o marido Carlos Augusto) de subir ao pódio executivo poti por mais quatro longos anos. A titular verteu lágrimas copiosas após a decisão do diretório do Dem (leia-se Zé Agripino, chefão estadual e nacional do partido) de defenestrá-la do projeto de reeleição sem dó nem um pingo de piedade. Ou, na versão oficial, os membros do diretório.
Jájá, apelido mimoso do senador que circula com desenvoltura no meio, desde o tempo dos políticos biônicos, indicados para cargos executivos pelos militares, foi taxativo e pragmático. A legenda deve apoiar uma aliança que assegurará, quer o pai, o terceiro mandato como deputado federal para o filho Felipe. Outro álibi simples brandido por sua excelência na reunião teve a participação direta da rosa expurgada: a tese da inelegibilidade da aspirante a candidata.
No discurso que fez aos companheiros de partido, Rosalba fez menção à faceta espúria das candidaturas sem lastro jurídico, mas ainda assim confirmados pelo fórum eleitoral: “a justiça eleitoral já prolatou reiteradas decisões, assegurando o registro de candidatos que, porventura, tenham inelegibilidade declarada por colegiado judicial, como seria o caso do TRE estadual”. Ou seja, se podem liberar outros enroscados com dilemas jurídicos, por que ela não o seria?
A notícia do descarte de Rosalba Ciarlini do processo eleitoral deste ano rapidamente repercutiu nacionalmente. O portal Uol, por exemplo, repisou a informação de que ela teve a pior avaliação entre os 26 Estados e o Distrito Federal, segundo pesquisa CNI/Ibope divulgada em dezembro/2013. Dos entrevistados, apenas 7% consideram o governo de Rosalba ótimo ou bom. Também ganhou o posto de pior colocação na avaliação da maneira de governar, com 13%, e apresentou o pior índice de confiança, com 11%. Um desastre.
A rosa então recorreu ao Parnaso, panteão da poesia e do livre curso às expressões d’alma, incluída essa alma conturbada pelas intempéries cíclicas da animada jogatina política. Bebeu, ora vejam, na expressão serena da poeta Cecília Meirelles, a esta altura com o túmulo revolto: “Aprendi com as primaveras a me deixar cortar para poder voltar sempre inteira”. Emendou a citação com uma confusa relação entre vida política e primavera, nas quais “o tempo faz rebrotar a verdade” ainda que em face de severas lesões e ferimentos.
Vitimizada ao extremo, não poupou os presentes de citação bíblica e nem mesmo de recorrer a Rui Barbosa, o águia de Haia, chamado a recitar em meio à verborragia: “Maior que a tristeza de não vencer é a vergonha de não lutar”. Não satisfeita, alçou voo, qual rolinha fora da gaiola, à poesia do português Fernando Pessoa: “se achar que precisa voltar, volte. Se perceber, que precisa seguir, siga”. Nos dias seguintes, assistiu-se ao enfraquecimento das pétalas da rosa. Em eventos públicos lamuriou-se: voltará aos palanques ‘se deixarem’. Triste fenecer rosáceo.
Poderia ter recorrido, no calor da fritura, a uma máxima do pensador italiano Nicolau Maquiavel, célebre autor de ‘O Príncipe’ (1513), obra clássica com sucessivas reedições e que trata dos estratagemas recorrentes no exercício político. “Os que vencem, não importa como vençam, nunca conquistam a vergonha.”
* Stella Galvão é jornalista e colaboradora do blog, professora da Escola de Comunicação e Artes da UnP, mestre pela PUC-SP e autora de ‘Calos e Afetos’ e ‘Entreatos’. Endereço no twitter @stellag19, e-mail: stellag@uol.com.br
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