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Artigo

A infame mídia brasileira não perde a chance de ser infame

por Leonardo Attuch, no Brasil 247

Nesta sexta-feira, 9 de maio, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva esteve em Moscou, onde representou o Brasil nas comemorações dos 80 anos da vitória sobre o nazismo. A data, celebrada como o Dia da Vitória, marca a rendição formal da Alemanha nazista ao Exército Vermelho, que pagou o maior preço humano pela libertação da Europa do terror de Adolf Hitler. Ao participar do evento e prestar homenagem à memória dos que tombaram para que a humanidade pudesse vencer o fascismo, Lula cumpriu seu papel de estadista e reafirmou o compromisso do Brasil com a paz, com os direitos humanos e com a História.

O gesto, no entanto, foi recebido com hostilidade pela imprensa tradicional brasileira. Em editorial, o jornal O Estado de S. Paulo classificou a visita de Lula como “o dia da infâmia da política externa brasileira” — expressão grave e desprovida de qualquer equilíbrio histórico ou moral. A crítica, mais do que desproporcional, é reveladora de um viés ideológico que insiste em atacar Lula mesmo quando ele se posiciona claramente ao lado dos valores universais da civilização. Também O Globo e a Folha de S.Paulo seguiram na mesma linha, reforçando uma postura de alinhamento automático à agenda de Washington — capital que, ironicamente, se vê hoje às voltas com o avanço do fascismo representado por Donald Trump e seus seguidores.

Questiona-se, diante disso, por que setores tão influentes da imprensa brasileira se voltam com tanta agressividade contra um presidente que defende a paz e que, em um momento simbólico da História, relembra a vitória sobre um regime genocida. O que incomoda nesses jornais não é a geopolítica, tampouco a diplomacia — é o fato de que Lula reafirma a soberania do Brasil e atua com independência em um mundo cada vez mais multipolar. A presença do presidente em Moscou ao lado de líderes de outras potências globais simboliza um Brasil que pensa com a própria cabeça, que honra a memória das vítimas da guerra e que compreende os riscos do retorno de ideologias extremistas.

Ao desqualificar esse gesto, os jornais em questão não apenas atacam Lula: atacam também a própria ideia de que a luta contra o fascismo deve ser permanente. O desprezo com que tratam a memória da Segunda Guerra evidencia uma perigosa tolerância com o revisionismo histórico e uma desconexão profunda com os valores democráticos. Lula não foi a Moscou para prestar apoio a este ou aquele governo, mas para reafirmar uma verdade histórica inquestionável: que o mundo deve se manter vigilante diante de ameaças autoritárias, onde quer que elas surjam.

É preciso lembrar que o mesmo setor da imprensa que hoje condena Lula por lembrar o fim do nazismo já apoiou o golpe de 1964, silenciou sobre os crimes da ditadura e aplaudiu a perseguição judicial que levou um inocente à prisão. Sua reação, portanto, não surpreende — apenas confirma uma longa tradição de oposição a projetos populares e soberanos no Brasil.

Ao atacar Lula por seu gesto em Moscou, a velha mídia revela mais sobre si do que sobre o presidente. Expõe sua dificuldade de conviver com a independência, sua resistência ao protagonismo do Sul Global e sua disposição em relativizar até mesmo as conquistas fundamentais da Humanidade, se isso for útil para manter sua narrativa de antagonismo. A História, no entanto, é implacável com os que hesitam diante da barbárie.

É por isso que, mais uma vez, se pode afirmar com precisão: a infame mídia brasileira não perde a chance de ser infame. E, ao fazer isso em uma data como o 9 de maio, se coloca mais uma vez no lado errado da História.

* Leonardo Attuch é jornalista e editor-responsável pelo 247

Fotos: Ricardo Stuckert/PR

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