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por Stella Galvão
O chamado para a crônica veio desta vez com um falecimento. Fernando Botero (1935-2023), artista plástico colombiano de altíssima envergadura, alçou voo para outros planos. Aos 91 anos, ainda trabalhava até ser pego no contrapé por aquela senhora trajada com uma túnica preta e ornada com uma foice que, mais dia menos dia, nos arrebata a todos. Botero deixa uma marca única e transferível. Sua obra figurativista, seja em pinturas ou esculturas, chegou a receber a alcunha de ‘Boterismo’ por seu estilo inconfundível. Consagrou-se mundialmente com seus personagens volumosos, cheios de volúpia e preenchimento.
Pude contemplar ao vivo, há uns dez anos, uma mostra exuberante de sua arte no Museu Botero em Bogotá. Depois, circulando pela região central da capital colombiana, encontrei mulheres com corpanzis que lembravam as figuras plasmadas pelo artista. Foi como ver um quadro se movendo, muito impressionante. Ou seja, algo da estrutura física de matronas em Bogotá, Medellín (cidade natal de Botero) ou outra cidade havia impregnado a palheta do pintor e os moldes do escultor.
Nestes tempos de arautos da fala culturalmente correta, falar da gordura alheia é atentar contra os direitos daqueles que ostentam pesos respeitáveis à balança. Tentaram acuar Botero. Ele pintaria gordos e gordas. Ao fazê-lo, cantaria loas ao ganho de peso ou os estaria expondo de maneira execrável? O artista passou toda a vida respondendo a perguntas que o questionavam quanto à adiposidade de seus modelos. Eu não pinto gordos, ele respondia como quem fora treinado. Nem morto o pouparam. Seu filho Juan Carlos Botero, em resposta à pergunta redundante, explicou à agência colombiana de notícias AT : “El estilo de Botero gira precisamente en torno a exaltar el volumen de las cosas pra darles grandeza”. E que grandes foram suas figuras. É dele uma famosa Monalisa rechonchuda.
Tanto que um adepto da extrema direita fascista, mesmo estribado e com plata sobrando, fugiria do colombiano. Botero foi um artista politizado e muito preocupado com a violência na América Latina, retratada em muitas obras. Em 2004, realizou uma série de pinturas que retratam torturas cometidas por soldados norte-americanos contra os prisioneiros de Abu Ghraib, no Iraque. As obras foram expostas em diversos países. Sua mostra “Dores da Colômbia” percorreu o mundo, denunciando a violência entranhada em seu país. Há dezenas de esculturas dele em sua Medellín natal, todas doadas, como foi parte de sua coleção pessoal para o museu consagrado à sua monumental obra.
Imagem: Tortura
*Stella Galvão é jornalista, cronista e colaboradora do blogdobarbosa
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