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Na reta final de seu governo, quando agitações políticas formavam terreno próspero para o golpe militar, o então presidente João Goulart chamou seu ex-ministro do Trabalho Almino Affonso para uma conversa.
Segundo Almino, Jango se disse num impasse. Era preciso fazer as reformas propostas, porque os apoiadores cobravam, mas elas nunca passariam. A situação econômica piorava e o governo não tinha apoio no Congresso – a oposição batia cada vez mais forte.
Dali a poucos meses, o então deputado foi um dos responsáveis por alertar o presidente sobre os generais que saiam de Minas Gerais. Jango foi derrubado e teve início a ditadura militar no país.
Hoje com 86 anos, o advogado amazonense familiarizado com as ameaças à democracia se diz angustiado com o momento político do país. Apesar de considerar “uma bobagem” a hipótese de que um golpe contra o governo esteja se desenrolando hoje, ele diz temer pelo futuro das instituições.
Leia abaixo trechos da entrevista:
BBC Brasil: Há um discurso recorrente, sobretudo entre apoiadores de Lula, que com as últimas etapas da Lava Jato está em curso um golpe na democracia. Você concorda?
Almino Affonso: Isso é bobagem. A explicação que o Moro deu (sobre a condução coercitiva de Lula) me parece de uma validez total. Ele precisava ter o depoimento. Cabe a ele analisar se as hipóteses têm fundamento ou não. Não vejo nisso (um golpe). Para considerar um golpe eu seria obrigado a admitir que não há causas para esse quadro que está havendo. Se levanta a proposição do impeachment e não faltam temas que o justifiquem. O resto é a decisão dentro das instituições, no Senado. (O impeachment) se formaliza por figuras que respeito muito, mas cadê a base política delas? O (Hélio) Bicudo não tem peso político. O PSDB assumiu a proposição? Não. Ficou lá rolando na mão do Cunha. Como se dá o golpe dessa forma? Tem que ter meio, começo, fim.
BBC Brasil: Você é a favor do impeachment?
Almino Affonso: Em princípio, sou favorável. É difícil a pergunta. Tenho a impressão que o problema maior do impeachment é quem fica em seguida. Mas, se disser que sou contra, parece que concordo com isto (o governo). E o impeachment é um instituição prevista na Constituição, não significa nenhuma ruptura da ordem democrática.
BBC Brasil: A crise política ameaça o sistema democrático de alguma forma?
Almino Affonso: O que me angustia é que você está em um país sem horizonte. Suponha que venha a vencer o impeachment, assumiria o PDMB. Neste quadro dramático que estamos vivendo, imaginar o PDMB governando… não consigo ver. O PSDB hoje é uma fratura de ponta a ponta. As grandes figuras não se falam. Você tem Aécio e Serra, adversários fidagais. O presidente Fernando Henrique, que é a liderança nacional, não gosta de intervir. Como PSDB fará no poder?
BBC Brasil: Há uma ausência de líderes políticos?
Almino Affonso: É visível. Faça um exercício comigo. Precisamos lançar um candidato a presidente da República, que assuma esse país que está precisando de uma figura que respeite, em que se acredite. Corra os nomes dos governadores, me arranje um para ser nosso candidato. Não encontro! Quando volto ao passado, podia haver a divergência que houvesse, não faltavam quadros.
BBC Brasil: Quais são os riscos?
Almino Affonso: Não se sabe para onde vai. Havia um cidadão na velha Grécia, chamado Aristóteles, que dizia “não há lugar vazio, o vazio é ocupado”. Sou rigorosamente contrário a qualquer movimento golpista, parta de onde partir. Peço a Deus que não ocorra, mas temo…porque estamos entrando num período que me angustia.
BBC Brasil: Mas você vê um movimento golpista?
Almino Affonso: Não vejo, temo. É a frase do Aristóteles. Está se dando um vazio. A presidente não é presidente, a Câmara não é Câmara. Quase todos os Estados estão em pré-falência…
BBC Brasil: Você refutou a possibilidade de um golpe em curso hoje.
Almino Affonso: Alguns entreveriam (um golpe) contra o que está no poder, contra o Lula, o meu medo é muito mais amplo. Meu medo é pelas instituições…excetuando o setor jurídico, que é uma coisa excepcional a meu modo de ver, o que há em torno do Moro. É uma coisa nova nesse país. O Supremo tem tido uma posição democrática excepcional.
BBC Brasil: Fora as jurídicas, você teme pelas outras instituições?
Almino Affonso: Sim. Mas de onde vem, como vem, não sei.
Foto: Ingrid Fagundez
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