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O Baú de um Repórter

O amigo e colega Flávio Marinho relembrou uma história ocorrida com ele ainda na época em que Fernando Collor de Mello estava assumindo à Presidência da República. Lá se vão quase 16 anos ou mais. Uma história que resultou em sua demissão do jornal Diário de Natal. Vamos ao fato:

A denúncia de Rubens Lemos e a demissão de Flávio Marinho do DN

O futuro ministro da Aeronáutica é um ex-torturador do Dói-Codi. Brigadeiro Sócrates é o seu nome. A denúncia partiu do jornalista Rubens Lemos, preso e torturado pela ditadura militar de 1964-84 sob a acusação de pertencer ao PCBR [ Partido Comunista Brasileiro Revolucionário], de que alguns preferiam traduzir o “R” de sua sigla como “do Recife”, cidade onde a organização teve origem.

Rubens Lemos – pai do jornalista Rubens Lemos Filho – foi prisioneiro do DÓI-Codi em Pernambuco durante a última ditadura. Na prisão, foi interrogado por um meirinho de trajes civis. Os interrogadores e torturadores da ditadura apresentavam-se anônimos e, às vezes, encapuçados diante de suas vítimas. Rubens Lemos gravou a fisionomia daquele “civil” que o interrogou nas dependências do DÓI-Codi, no Recife, assim como sua voz.

Pois muito bem: A denúncia de Rubens Lemos foi feita ao jornalista Flávio Marinho, então repórter político do Diário de Natal, em uma conversa informal num fim de semana na praia de Búzios, litoral sul do Rio Grande do Norte, na casa do também jornalista Rogério Cadengue – ja falecido. Era aniversário de Cadengue, salvo engano, e tanto Lemos como Marinho estavam por lá. Isso era um sábado. Eu era também repórter de Política do DN. No domingo Flávio me ligou dizendo ter uma bomba. Perguntei do que se tratava e ele me falou.

Nessa época o Diário não circulava na segunda-feira. A matéria foi editada para sair na terça-feira. Realmente ela estourou como uma bomba. Teve inclusive repercussão nacional. Collor estava para nomear o brigadeiro Sócrates para ser ministro da Aeronáutica. Diante da denúncia recuou da decisão. No entanto, a direção dos Diários Associados tomou partido e determinou ao diretor geral do Diário, Albimar Furtado, demissão imediata de Flávio Marinho. A denúncia de Rubens Lemos também sobrou para o editor geral do jornal Aluísio Lacerda que foi afastado do cargo.

Essa lembrança hoje é contada de uma forma até engraçada, mas na época Flávio Marinho ficou receoso tamanha foi a repercussão do fato. A imprensa nacional se mobilizou para ouvir outros torturados. O brigadeiro Sócrates, claro, negou a denúncia, mas mesmo assim Collor não o nomeou.

Obs do Blog: O web-leitor que quiser conhecer outras memórias deste repórter é só ir em BUSCA na coluna à direita e digitar uma palavra-chave tipo Baú

* Lendo o texto o colega e amigo Aluísio Lacerda, um dos personagens na tumultuada reportagem de Flávio Marinho que redundou na sua demissão e no afastamento do cargo de editor geral do DN do próprio Lacerda, ele fez as seguintes observações:

1 – Collor não recuou. Sócrates foi nomeado sim. Lá adiante, meteu os pés pelas mãos e foi afastado.

2 – Toda a chamada grande imprensa caiu de pau no DN. “Denúncia de um jornal de província”, publicava-se.

3 – Apenas a revista IstoÉ não embarcou na baboseira. “Calma, gente. A fonte mora em Natal”, alertou a revista.

4 – Ai a IstoÉ retoma o assunto: “Não é a primeira vez que este ministro é acusado de torturador”. E cita a matéria do DN.

5 – Dois meses depois, a mulher do ministro muda todo o mobiliário do apartamento funcional. Uma fortuna. Só ai o ministro cai.

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5 Responses to O Baú de um Repórter

  1. José Alves disse:

    Caro Barbosa
    Guardei o recorte desta matéria do DN. Na époc do fato, trabalhava com o Aluísio na Comunicação Social do INSS.
    Lembro da repercussão em nível nacional. Muita gente ligando para repercutir a matéria. Anos depois, mostrei a Aluísio a página “já amarelada” que deu muita dor de cabeça aos jornalista do Diário de Natal comentando o que realmente ocorreu.

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