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por Ricardo Lagreca
Olhar uma morada, significa sentir a vida de uma pessoa. Ali estão guardadas todas as coisas dela. Suas paixões, seus medos, seus planos, seus segredos, sua intimidade, seu eu. Tudo dela. Para isto, cuida-a como sua maior propriedade e amiga. Não dá o direito a ninguém a penetrar, sem que o deixe. É o seu refúgio. Como presente, reveste ela do maior carinho, na sua beleza arquitetônica.
Como sente bem ao avistá-la de longe! Identifica-se logo de imediato. Basta olhar o seu telhado, com a irradiação dos seus encantos. As telhas colocadas umas sobre as outras, explodem as cores de alegria da vida.
Transmitem ainda, o agradável barulho dos pingos das chuvas. Encobrem tudo que ali pode se passar. Protegem bem o seu dono.
O tempo passa e ficam mais bonitas. Abrigam o lodo e como recompensa recebem suas cores. Mas o tempo também cobra todas as coisas. Cobra que todos têm que se adaptarem ao desenvolvimento. Tudo daria certo, em um processo evolutivo natural, bem pensado, tratado com o cuidado necessário às transformações normais da humanidade. Isto é, os nossos sentimentos, não devem jamais ser esquecidos.
Inicialmente, o que vimos foram os telhados das novas moradas, os edifícios, passarem a ser apenas o final físico da construção. Sem qualquer espécie de trabalho arquitetônico. Uma arquitetura sem beleza, como que, caixotes cobertos por outros menores e cheios de espigões verticais, para transmitirem e receberem mensagens. Meu Deus! Agora nos últimos anos, um avanço tecnológico e necessário é colocado na prática e novamente vamos perdendo mais um pedacinho daquilo que passamos tanto tempo, através de tantas gerações, tendo sobre a nossa morada, algo como se fosse, uma mistura de encanto e proteção. Os telhados novamente cedem seus espaços para ser encobertos, agora, por placas que acumulam energia solar. Sempre todos com o mesmo aspecto, sem criações e monótonos. Transformam eles completamente.
Mas, em troca, passamos a ter uma energia limpa e mais barata. Não há dúvidas sobre isto. Todavia, poderíamos tratar esta transformação com mais cuidado e pensar que isto não é tudo o que queremos. Como será então o futuro, sem as explosões das colorações vermelhas, como se as telhas fossem flores e sem os seus lodos a habitarem? Até os gatos sentirão. Perderão o lugar preferido para seus amores. Os outros, mais distantes de nós, perguntarão. O que houve? Outrora, podíamos ver neles, tanta beleza, tanto amor. Nos causavam inveja. Agora, estão ficando iguais a nós.
*Ricardo Lagreca é médico cardiologista, professor aposentado da UFRN, foi diretor do HUOL (Hospital Universitário Onofre Lopes), e ex-secretário de Saúde do Estado do Rio Grande do Norte
Foto: Divulgação
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