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Causos que marcaram os 13 anos do Blog: O dia em que chamei o diretor de redação de ditador

Está no Baú de um Repórter

Atuar em redação de jornal ao mesmo tempo que é uma coisa fascinante é estressante principalmente quando se é editor. O dia-a-dia com tempo para fechar o jornal, o chamado deadline, o repórter que não chega com a matéria ou a reportagem que não pode ser feita, tudo isso leva ao estresse. Foi num dia como esse que acabei discutindo com o diretor de redação. Vamos ao fato:

Eu era editor de Economia do Diário de Natal quando o jornalista Alfredo Lobo – já falecido – assumiu o cargo de diretor de redação do jornal. O Diário passava por mudanças de ordem estruturais e na sua feição gráfica. Lobo estava vindo do Correio Braziliense para processar estas modificações e ser efetivado como diretor de redação.

Não sei por que cargas d`água, mas senti logo ao sermos apresentado que ele não fora com a minha cara. Nem eu com a dele, confesso. Seu jeito sisudo e a maneira como se dirigia aos repórteres – uma vez uma repórter chegou a chorar – não me agradava, embora fosse um grande jornalista. Comprovou isso durante o tempo em que esteve a frente da redação do DN. Aliás, aprendi muito com ele no jornalismo.

Contudo, apesar de não ter ido com a sua cara profissionalmente nos dávamos muito bem. Mas um dia sem mais nem menos chego à redação para trabalhar e me vem a informação do editor do Caderno Brasil, o colega e amigo Roberto Machado, de que a partir daquele dia por ordem de Alfredo Lobo não mais passaria a editar o Caderno de Economia. Seria sub-editor de Brasil. O meu salário continuaria o mesmo, mas não teria mais o cargo de editor. Questionei com Machado e ele me disse que era uma decisão de Alfredo Lobo.

Pois muito bem: fui auxiliar Machado no fechamento do Caderno Brasil. As horas passavam-se e eu não conseguia entender a posição tomada por Lobo. Já passavam das 18h, hora do pique na redação e decidi então ir falar com Lobo para saber dele quais foram os motivos que o levaram a tomar tal decisão.

Fui até a sala onde ele se encontrava – apenas uma vidraça dividia o espaço entre a redação e sua sala – e indaguei dele porque não continuava mais como editor de Economia. Com a atenção para o seu computador, onde estava editando a primeira página do jornal, ele sequer olhou pra mim e respondeu secamente: Foi uma decisão que tomei, só isso. Insisti para saber os motivos. E ele continuou sem olhar pra mim e reafirmou o que dissera. Não satisfeito com a resposta o sangue me subiu à cabeça e disse a ele que era um ditador em alto e bom som para toda a redação ouvir. Afirmei que não era criança para ser tratado daquela maneira e que merecia uma satisfação. Que ele tivesse pelo menos a consideração de olhar pra mim, afinal não estava falando com um cachorro. Puto da vida sai de sua sala sem mais condições de continuar a trabalhar. Falei com Machado e disse que iria pra casa esfriar a cabeça e só retornaria no dia seguinte.

Dias depois soube que Alfredo Lobo me retaliara simplesmente porque não gostava de sindicalista. Na época era dos quadros do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Rio Grande do Norte – diretor de Comunicação do Sindjorn.  Estranhei porque durante o tempo em que pertenci a direção do Sindicato nunca fiz qualquer movimento dentro da redação. Mas a partir daquele momento passei a entender o por quê de Lobo não ter ido com a minha cara desde o dia em que fomos apresentados. Certamente alguém buzinou no seu ouvido que eu era sindicalista.

Mas Alfredo Lobo teve o seu lado positivo. Brigou pela melhoria salarial dos profissionais da redação do DN e além disso aprendi muita coisa no jornalismo com ele.

Em tempo: anos após sua morte e depois de ter publicado essa história no Baú de um Repórter, recebi um e-mail com foto de um filho de Alfredo Lobo que dizia o seguinte:

Hugo-Logo

Olá, sou filho do Alfredo Lobo e hoje completam-se 10 anos de seu falecimento. Nostálgico, fui à caça de referências a ele na internet e encontrei algumas postagens suas contando histórias nas quais ele, de uma forma ou de outra, participou. Fiquei muito feliz de resgatar estas memórias e mais algumas que encontrei largadas nos meandros da Internet, a maioria escrita alguns anos depois de sua morte. As histórias, de certa forma, ratificam a visão que tenho de meu pai, levando em conta, claro, que as pessoas podem ser muito diferentes nas esferas pública e privada. Embora sisudo seja uma ótima definição dele, ressalto, com a autoridade de quem viveu 3 anos só com ele, que em seus últimos anos a carranca havia diminuído bastante. Mas isso é só curiosidade de um filho nostálgico mesmo.Obrigado por reconhecer (e dar notícia) dos aspectos positivos de meu velho pai, apesar das divergências pessoais que vocês tiveram. Abraço, Hugo.

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