Artigo

Com caso Zucolotto, há um cadáver na sala de visitas da imprensa

por Luís Nassif, no Jornal GGN

Tudo muito bom, tudo muito bem. Excluir um jornal de uma licitação de R$ 160 mil configura-se um atentado à liberdade de imprensa, assim como impedir a participação de jornalistas de veículos críticos nas coletivas de imprensa de governantes.

Os dois fatos despertaram uma onda de solidariedade e de defesa da liberdade de imprensa como valor maior da democracia.

Mas vamos aos fatos: a chamada grande imprensa está, de fato, atuando como agente avançado das liberdades democráticas, como a primeira sentinela do sistema de freios e contrapesos na coibição de abusos? Em um país civilizado, em que a imprensa cumpre rigorosamente com suas obrigações, é impossível varrer grandes crimes para baixo do tapete. Embora as armas químicas do Iraque ainda se constituam em uma mancha na imagem da imprensa norte-americana.

A escandalização correta é a arma para evitar a naturalização dos abusos. Ou seja, se julgo que a imprensa vai deixar passar em branco determinados crimes, aumenta a propensão para o seu cometimento. É uma regra tão exata quanto as leis de Newton.

Vamos ver, então, como a mídia brasileira – e as instituições em geral – atuam em relação a grandes escândalos. O caso Zucolotto-Arns não é pouca coisa. Um advogado, Tacla Duran, apresenta provas documentais de que pagou duas pessoas íntimas da corte de Sérgio Moro para escapar da perseguição da Lava Jato: os advogados Marlus Arns e Carlos Zucolotto. O primeiro foi parceiro de Rosângela Moro nas ações das APAEs do Paraná; o segundo é conhecido publicamente como melhor amigo de Sérgio Moro e como parceiro e sócio de Rosângela. Ao contrário dos demais advogados de delação, os dois fazem parte do círculo íntimo de Sérgio Moro e dos procuradores da Lava Jato.

No segundo de Zucolotto, há a comprovação de que sua proposta – de reduzir a multa de Tacla Duran de US$15 milhões para US$ 5 milhões, mediante o pagamento de US$ 5 milhões por fora – foi acatada pela Lava Jato. Tanto que o procurador Roberto Pozzobon encaminhou a Tacla Duran um e-mail referendando as condições propostas por Zucolotto. Há um cadáver no meio da sala e a brava mídia fingindo que não vê.

Como é possível passar em branco uma suspeita de tal envergadura? As suspeitas se alastram e, agora, batem no mais experiente procurador da Lava Jato, Januário Paludo. E nada dos jornais entrarem.

É uma soma muito grande de indícios. No mínimo teria que ser requisitada a quebra do sigilo bancário e telefônico de todos os suspeitos. Mas varre-se para baixo do tapete suspeita de tal ordem, em uma investigação da envergadura da Lava Jato.

Alô pessoal, é claro o pacto que mancha a imprensa brasileira. As autoridades só consideram denúncias as que vêm da mídia corporativa. E a mídia corporativa blinda todas as suspeitas de crimes envolvendo a Lava Jato. Atenção: falei em suspeitas de crime, não em meras irregularidades processuais.

Apesar da praga das fake news, os jornalistas sabem muito bem o que são notícias jornalísticas fundamentadas. E elas circulam pela Internet, por sites, por redes sociais, chegando ao universo dos leitores bem informados.

Como é possível, então, manter-se essa hipocrisia de fingir que os fatos não existem ou não aconteceram? Como é possível falar em julgamento isento, se possíveis pecados mortais da Lava Jato são blindados dessa maneira? Como é possível defender a liberdade de imprensa com tal seletividade?

Foto reproduzida da Internet

Share Button

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

WP Twitter Auto Publish Powered By : XYZScripts.com