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O debate e a entrevista simultâneos definiram o peso real de Bolsonaro, por Ion de Andrade

Está no Jornal GGN

Há muitas pesquisas sendo realizadas por agora com amostras que giram em torno a dois a três mil entrevistados com os quais os institutos pretendem ter, e têm, 95% de confiança e dois pontos de margem de erro para mais ou para menos.

Seria um sonho de consumo para qualquer instituto de pesquisa aferir a preferência com uma amostra de milhões de brasileiros.

Ora, foi precisamente isso que Bolsonaro proporcionou ao preferir dar a entrevista à Record em lugar de ir ao debate na Globo: expôs o seu eleitorado ao escrutínio de uma proporcionalidade amostral com milhões de eleitores.

A audiência medida segundo as fontes habituais apontou para 26,2 pontos para o debate entre os candidatos contra 12 pontos para a entrevista.

É inevitável constatar que assistiram a entrevista os eleitores decididos e os eleitores potenciais ou simpatizantes das propostas da extrema direita que ainda estão tomando decisões. Os dois grupos, o do debate e o da entrevista, reuniram 38,2 pontos totais (26,2 + 12) o que reduz os 12 pontos de Bolsonaro a 31,4% desse universo, que não inclui por exemplo a audiência de outros canais (o SBT teve 11,8 pontos) nem os que por razões diversas resolveram não assistir ao debate, nem à entrevista. Esses números poderiam ser assimilados a uma espécie de “votos válidos”, o que reduziria proporcionalmente o eleitorado se fosse considerado esse universo maior. Se somássemos a assistência do SBT, por exemplo, os 12 pontos de Bolsonaro representariam tão somente 25% da audiência.

Porém a entrevista para Bolsonaro não era uma coisa qualquer, foi a sua primeira aparição pública de campanha depois da alta hospitalar. Razão porque, perante o seu eleitorado, teve significado maior. Agrega-se a isso o fato de que vivemos clima de densa polarização política. Esses dois fatores sugerem que o eleitorado da extrema direita deva ter assistido maciçamente à entrevista, o que torna a contagem da audiência particularmente interessante, exatamente porque no mesmo horário ocorria o debate que, por razões análogas, reunia o eleitorado não bolsonarista.

Ir a uma entrevista na mesma hora do debate foi um erro estratégico porque definiu de forma extraordinariamente precisa o peso do eleitorado bolsonarista.

No campo do debate, reconheçamos, a polarização ocorreu provavelmente em torno às candidaturas que têm chance de ir para o segundo turno ou que têm lideranças emblemáticas. Isso sugere que a maioria da audiência era composta por eleitores de Haddad e de Ciro, além de outros candidatos, claro. Em comum, nesse grupo, certamente, algum grau de rejeição ao candidato que dava entrevista no mesmo horário. Essa audiência reuniu 68,6% dos telespectadores

Para Bolsonaro, a entrevista deveria ter transbordado em muito aquilo que compõe o seu eleitorado conhecido. Noutros termos deveria, considerando seus 30% de eleitorado assegurado, ter reunido ampla margem de interessados, com audiência desejável superior aos 40%. Isso não ocorreu o que sugere que a extrema direita pregou para convertidos.

A ver tais números na antevéspera da eleição há que se considerar se não constituem um limite muito próximo do teto. Essa talvez seja a razão porque, obsessivamente, a campanha da extrema direita queira levar as eleições no primeiro turno.

* Ion de Andrade é médico e professor universitário. É colaborador de uma instituição social ligada à igreja católica no bairro Mãe Luiza em Natal

Foto reproduzida do Jornal GGN

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