Artigo

Um presidente que obriga um ministro a mudar bula de remédio não tem mais como se sustentar no governo

por Carlos Alberto Barbosa

O Messias não tem mais como se sustentar no governo. As denúncias jorram como água em cachoeira. A da interferência na Polícia Federal, já comprovadas, diga-se de passagem, se torna fichinha frente a revelação feita pelo ex-ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, que afirmou que o presidente tentou obrigá-lo a mudar a bula da cloroquina para o medicamento ser indicado ao tratamento de pacientes diagnosticados com coronavírus, mesmo sem comprovação científica. 

Isso é crime e talvez pelo mesmo motivo Nelson Teich tenha deixado também o governo. Lembro que após sair do Ministério da Saúde,
Teich postou em uma rede social que o uso da cloroquina no tratamento contra a Covid-19 deve ser feito com restrições, já que a substância pode desencadear efeitos colaterais. Portanto, estaria aí o motivo de sua saída do Ministério da Saúde. Detalhe: percebia-se um certo constrangimento dos dois ex-ministros quando se tocava no assunto nas coletivas de imprensa.

Pra se ter uma ideia da gravidade da denúncia de Mandetta, levada à imprensa nesta quinta-feira (21), transcrevo aqui trecho de sua declaração:
“Me pediram para entrar numa sala e estavam lá um médico anestesista e uma médica imunologista. […] E a ideia que eles tinham era de alterar a bula do medicamento na Anvisa, colocando na bula indicação para Covid”.  Confira aqui.

Isso é gravíssimo, é crime porque atenta contra a saúde do povo e a denúncia tem que ser apurada. O Conselho Federal de Medicina, assim como a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), têm que se pronunciar. Não se concebe um presidente da República obrigar um ministro da Saúde a mudar a bula de uma medicação somente para satisfazer o seu desejo, ou melhor, o seu transtorno psicótico.

A cloroquina ganhou destaque no noticiário nacional, após ser defendida por Bolsonaro. A Apsen é a empresa farmacêutica no Brasil responsável pela produção do remédio composto por hidroxicloroquina e tem como dono um eleitor bolsonarista, o empresário Renato Spallicci.

A denúncia de Mandetta aumenta ainda mais a pressão em cima de Bolsonaro. Ele já descumpriu recomendações da OMS (Organização Mundial da Saúde), ao comparecer a manifestações de rua, enquanto a entidade pede que as pessoas evitem aglomerações para diminuir a propagação do coronavírus. 

Alterar a bula de um medicamento usado no tratamento e profilaxia de malária em regiões onde a doença é susceptível ao seu efeito, para tentar a “cura” do coronavírus, sem, sequer, comprovação científica de que isso poderia ocorrer, é crime. O presidente Jair Messias Bolsonaro está extrapolando os seus limites e precisa ser contido.

Como bem disse o ministro do STJ (Superior Tribunal de Justiça),
Rogerio Schietti, “em nenhum país, pelo que se sabe, ministros responsáveis pela pasta da Saúde são demitidos por não se ajustarem à opinião pessoal do governante máximo da nação e por não aceitarem, portanto, ser dirigidos por crenças e palpites que confrontam o que a generalidade dos demais países vem fazendo na tentativa de conter o avanço dessa avassaladora pandemia”. 

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